
Maracatu desfila nas ruas do Recife Antigo na terça-feira de carnaval (Foto: Léo Caldas/g1)
O Recife é capital brasileira onde mais se brinca o
carnaval. A revelação foi feita pela pesquisa "Cultura nas Capitais",
encomendada pelo Ministério da Cultura e divulgada nesta quinta-feira (2). O
levantamento perguntou a 600 pessoas no Recife quais foram as atividades
culturais que elas participaram ou realizaram ao menos uma vez nos últimos 12
meses. Na cidade, 71% das pessoas que afirmaram frequentar festas populares
disseram que participaram de desfiles e blocos de carnaval.
A cidade de Salvador ficou em segundo lugar neste ranking,
com 63% de participação em atividades relacionadas à Festa de Momo.
A cidade de Belo Horizonte alcançou a terceira posição, com
62% de participação nas festas carnavalescas. Confira as cidades com maior
percentual de participação no carnaval, segundo o levantamento:
Recife - 71%
Salvador - 63%
Belo Horizonte - 62%
Maceió e João Pessoa - 58%
Rio de Janeiro - 57%
Segundo o pesquisador João Leiva, diretor da JLeiva Cultura
& Esporte - que elaborou o estudo, a participação dos moradores do Recife
nas festas populares e no carnaval, de forma específica, está relacionada à
ligação da população com as tradições locais.
"As festas de São João lideraram a participação das
pessoas em todas as cidades pesquisadas, mas no Recife o acesso a blocos e
desfiles de carnaval foi o maior de todas as capitais. O Recife tem um carnaval
forte, que mobiliza as pessoas. Outro fator importante é a descentralização das
atrações. O fato de acontecer em vários lugares da cidade permite a
participação de diversos públicos também”, explicou João Leiva, em entrevista
ao g1.
O pesquisador chamou a atenção também para a grande
participação do cinema como opção de cultura usufruída por quem mora na capital
pernambucana. Dos entrevistados, 46% disseram que ter acesso a assistir aos
filmes nos cinemas.
“Foi o percentual mais alto entre as capitais do Nordeste.
A nossa percepção é que o fato de ter um festival famoso e consolidado, e uma
produção local importante, com filmes e diretores premiados, podem ter
contribuído para o resultado”, falou João Leiva.
Brega é o ritmo mais ouvido
Apesar de ter muito em comum com o restante do país em
relação aos temas das músicas mais tocadas, as playlists dos recifenses não têm
o sertanejo no topo. Na capital pernambucana, as letras sobre relacionamentos
desfeitos, traições, farras e canções românticas tocam em ritmo de brega -
gênero que lidera a preferência das pessoas entrevistadas pela pesquisa
"Cultura nas Capitais".
De acordo com o estudo, os ritmos musicais mais consumidos
no Recife foram:
Brega (incluindo brega-funk): 33%
MPB: 30%
Gospel: 24%
Pagode: 20%
Forró: 18%
Sertanejo: 15%
Rock: 14%
Pop: 13%
Romântica: 9%
Internacional: 8%
Para elaborar a estatística, o estudo perguntou aos
entrevistados qual estilo ou tipo de música que mais ouviam em primeiro,
segundo e terceiro lugar, sem citar alternativas. O resultado considerou as
três respostas indicadas pelo público.
Em relação ao sertanejo, o ritmo ficou na sexta posição
entre os entrevistados no Recife, sendo consumido por 15% do público ouvido
pelo estudo. O resultado foge da média nacional, onde o gênero musical foi
indicado como um dos três estilos mais ouvidos por 34% dos entrevistados.
Preferência pela cultura local
Para o professor e pesquisador do departamento de
Comunicação Social da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Thiago Soares,
o sertanejo, consumido pela maior parte dos brasileiros, e o brega, ouvido
massivamente pelos recifenses, compartilham muitas semelhanças estéticas, mas
historicamente a cidade tende a priorizar a produção cultural local.
“São músicas românticas, que falam de dor de cotovelo, de
separação, de amor… Tem essa coisa também das mulheres cantando, aquela ideia
das patroas, as mulheres empoderadas. No brega, você também vai ter esse
perfil”, contextualizou o pesquisador, em entrevista ao g1.
Segundo Thiago Soares, existem dois principais fatores que
explicam a forte presença do brega no cotidiano recifense: o primeiro é o
estímulo, através do poder público, do reconhecimento e do consumo de ritmos
locais, especialmente durante o carnaval.
“Se a gente só olhar historicamente, o Recife tem um
consumo de produção cultural, sobretudo na música, voltado para artistas
locais. Eu localizaria, por exemplo, o Manguebeat, lá nos anos 1990, como um
primeiro movimento de valorização dessa música [produzida em Pernambuco] no
âmbito midiático”, explicou o professor.
O segundo fator para o destaque para o brega enquanto
gênero mais ouvido pelos que responderam à pesquisa "Cultura nas
capitais", segundo Thiago Soares, foi a lei estadual nº 16.044, de 2017,
que reconheceu oficialmente o brega como expressão cultural pernambucana ajudou
na consolidação de um circuito de divulgação do gênero musical.
O professor acrescentou que a cadeia produtiva do brega no
Recife é consolidada e reúne artistas, produtores, empresários, contratantes e
consumidores. O próprio subgênero brega-funk demonstra, para o pesquisador, que
o brega segue como um ritmo vivo capaz de se transformar.
“A gente tem um circuito cultural muito forte aqui, com
casas de shows, produtoras de videoclipes, produtores musicais, que fazem o
brega estar constantemente na cultura da noite aqui de Pernambuco. [...] O
brega-funk é uma espécie de ‘jovialização’ do brega, tudo isso faz parte”,
contextualizou o pesquisador da UFPE.
Consumo de cultura no Recife
O levantamento elaborado pela JLeiva Cultura & Esporte
perguntou a 600 pessoas no Recife quais foram as atividades culturais que elas
participaram ou realizaram ao menos uma vez nos últimos 12 meses.
O resultado mostrou que 56% dos recifenses leram algum
livro no intervalo de um ano, sendo a atividade cultural mais realizada na
capital pernambucana no período.
Confira as atividades culturais mais realizadas no Recife,
segundo a pesquisa:
Leitura/Livros: 56%
Jogos eletrônicos: 53%
Cinema: 46%
Locais históricos: 45%
Festas populares: 43%
Shows de música: 42%
Dança: 25%
Museus: 19%
Biblioteca: 19%
Feiras do livro: 18%
Além de conferir como os recifenses consumiram cultura, o
levantamento também perguntou foram as atividades culturais que os
entrevistados nunca tinham realizado. O resultado mostrou que mais de 70% das
pessoas nunca tinham ido a concertos (75%) e saraus (72%).
Feiras do livro (48%), espetáculos de dança (41%), teatro
(39%), museus (36%), jogos eletrônicos (32%) e circo (31%) completaram as
atividades nunca realizadas pelas pessoas entrevistadas.
Dificuldade de acesso a cultura
A apresentação da pesquisa “Cultura nas Capitais” aconteceu
nesta quarta-feira (2), durante seminário realizado no Teatro Hermilo Borba, no
Centro do Recife, com a presença de autoridades, estudiosos e artistas.
Durante o evento, a secretária de Cultura do Recife, Milu
Megale, pontuou que mesmo com uma diversidade de equipamentos culturais
públicos gratuitos e acessíveis à população, como museus, existe uma
dificuldade de ampliar o público que frequenta esses espaços.
"A gente tem muitos museus, mas a gente precisa
incentivar e criar público para participar mais dessas coisas. [...] Tem os
festivais, tem as festas populares, mas a gente sabe que tem muito do mesmo
público. Precisamos criar novos públicos, fazer com que as pessoas vão mais ao
teatro, frequentem mais o cinema, participem mais das danças", pontuou a
secretária.
Em relação ao
território da cidade, o espaço mais citado entre os entrevistado foi a Praça do
Marco Zero, no Bairro do Recife. O segundo lugar com mais menções diretas foi o
"Recife Antigo", como popularmente é chamada toda a região turística
do Bairro do Recife.